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DESIGNERS PODEM MUDAR O MUNDO

Como o design de produtos e serviços pode nos ajudar a transformar a forma como vivemos e consumimos.

Por Carolina Bastos, colaboradora da Escola São Paulo  

Para onde estamos indo como sociedade? Estamos tomando decisões conscientes, ou estamos apenas seguindo o fluxo de um comportamento irresponsável, nos eximindo de nossas responsabilidades e nos autodestruindo?  

Essas perguntas já faziam sentido em 2019, quando nem eu e nem você que lê esse texto agora poderíamos imaginar que 2020 seria um ano de acontecimentos tão avassaladores. Além das questões humanitárias e de saúde, em algumas semanas, milhões de pessoas ao redor do mundo tiveram que mudar a maneira como trabalham, estudam, se alimentam, se divertem, convivem, consomem… enfim… vivem. E o que os designers podem, devem e estão fazendo com isso?  

Conhecer e entender o Design Sustentável, nos dá a certeza de que é possível transformar todo um sistema por meio de ações concretas, utilizando ferramentas e processos de desenvolvimento de produtos e serviços que nos respeitem como espécie, e que também respeitem nossa casa, nosso planeta. Durante essa pandemia, ficou mais evidente que nossas escolhas diárias tem um impacto coletivo muito grande. O que e como vamos lidar com o que descobrimos é o que pode (e provavelmente vai) moldar o nosso futuro e das próximas gerações.

O lixo é um erro de design

Nessa fase de isolamento social, muito tem se falado sobre nossa alimentação, como muitas pessoas estão re-descobrindo a cozinha e como podemos usar essa oportunidade para fazer escolhas mais saudáveis e conscientes. Além disso, fica mais claro que consumimos embalagens demais, plástico demais e que isso não faz nenhum sentido.  

No livro “Daily Bread: What Kids Eat Around the World, usando como exemplo nossas ações mais cotidianas, o fotógrafo americano Gregg Segal fotografou crianças ao redor do mundo, com diferentes perfis, ao lado de todo o lixo que produziram em uma semana. Apesar da beleza das imagens, é chocante ver mais uma vez como, infelizmente, estamos destruindo nosso planeta. Segal mostra que, ao contrário dos alimentos embalados e processados ​​consumidos principalmente nos países desenvolvidos, ainda existem diversas bolhas de culturas tradicionais em cada continente, que comem, em grande parte, da mesma maneira como tem feito há centenas de anos. No Mediterrâneo, por exemplo, as pessoas gastam uma parcela maior de sua renda em produtos frescos, em vez de encher seus congeladores com alimentos cheios de conservantes e embalagens plásticas. Comparando as imagens, é possível ver claramente questões sobre saúde e sustentabilidade e o livro serve como catalisador para questionarmos cada vez mais nossas escolhas.

Há alguns dias, outro projeto de Segal, o 7 Days of Garbage”, foi selecionado para a 7ª edição do Tokyo International Photography Competition, e estará na exposição “Turbulence”, que trata das causas e efeitos das mudanças climáticas e segundo ele: “será realizada em Tóquio, Taipei, Dublin e Brooklyn assim que retornarmos à (relativa) normalidade.”.

Segundo relatório da Ellen MacArthur Foundation, “The New Plastics Economy: catalysing action“: Quarenta anos após o lançamento do primeiro símbolo universal de reciclagem, apenas 14% das embalagens de plástico são recolhidas para reciclagem a nível global […] Dado o crescimento projetado na produção, em um cenário de negócios, em 2050, os oceanos poderiam conter mais plásticos do que peixes (em peso)”

No Brasil, apesar do aumento da demanda nos últimos anos, apenas 13% de todos os resíduos sólidos urbanos produzidos são destinados para a reciclagem, de acordo com levantamento do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). Segundo estudo do Ibope Inteligência, 66% dos brasileiros sabem pouco ou nada sobre coleta seletiva, 75% não separam os materiais recicláveis, 39% não separam o lixo orgânico do inorgânico e 56% não utilizam serviço de coleta seletiva.  

Segundo a Abrelpe (Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais) a quantidade de resíduos domiciliares ao longo deste período de pandemia será de 15 a 25% maior, e na área de resíduos hospitalares o crescimento será de 10 a 20 vezes.  

Qual futuro você quer alcançar?

É urgente adotarmos uma postura mais consciente em relação à maneira como consumimos e desenvolvemos nossos produtos e serviços. Se antes falhamos como sociedade, especialmente nesse sentido, agora temos a oportunidade de fazer diferente e garantir um futuro melhor para nós e para as futuras gerações.  

A inovação e a colaboração podem ajudar a desenvolver ainda mais nossa aprendizagem coletiva e se tornar um chamado à ação para a criação de novos elos e valores dentro das esferas de produção e consumo. Mas, para tornar essa transição bem sucedida, é crucial saber onde queremos chegar e o que queremos alcançar. Qual futuro você quer alcançar? (Eloisa Artuso)

Segundo Eloisa Artuso, designer e nossa professora de Design Sustentável, “a responsabilidade social e ambiental do designer claramente não se limita apenas aos produtos, as embalagens também representam uma enorme parcela dos impactos causados pelo modelo de desenvolvimento econômico e produção industrial global, e devem ser repensadas urgentemente. Está na hora de uma reformulação radical na maneira como as embalagens são pensadas, produzidas e utilizadas. Mas para isso, é imprescindível um esforço concertado envolvendo a indústria, o governo, o terceiro setor e a sociedade civil, para promover ações coletivas e setoriais para reduzir as pegadas de carbono, água e resíduos dos produtos e suas embalagens, e impulsionar a criação de um valor compartilhado. Apoiar a utilização inteligente de recursos, produções eficientes e processos de reutilização e reciclagem, proporcionará crescimento econômico, benefícios sociais e criará novas oportunidades de negócios.”

Aqui na escola, nós acreditamos que a economia criativa é um agente de transformação e que, por meio dela, podemos, juntos, repensar futuros possíveis. Estamos todos conectados, e todas as nossas ações profissionais e pessoais afetam não só nossa carreira, mas o mundo como um todo. Sabemos que a decisão particular transforma o coletivo, e que nesse momento, podemos juntos ressignificar nosso modo de estar no mundo.  

Termino citando o designer dinamarquês Nille Juul-Sørensen:
“Não é sobre como será o futuro. Mas como será o futuro que nós estamos desenhando.”.

#FiqueEmCasa. Fique bem.  


#escolasaopaulo #descubra #reinvente #viva  #FiqueEmCasa com a Escola São Paulo! #ContinueEmCasa#VaiDarTudoCerto

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ENTRAMOS NO CHEQUE ESPECIAL COM O PLANETA

Sustentabilidade

E isso não é nada bom 

No fim de julho, a humanidade utilizou todo o estoque de árvores, água, solo fértil e peixes disponíveis na Terra para todo o ano de 2018. Desde o dia 1º de agosto, estamos em débito com o planeta, utilizando recursos além da capacidade de regeneração do planeta,  operando, oficialmente, no “cheque especial”. É o que aponta o levantamento feito pela Global Footprint Network (GNF), uma organização não governamental de pesquisa de recursos naturais e mudanças climáticas que avalia o impacto do homem no mundo.

Até o fim do ano, teremos consumido 1,7 planeta Terra para atender aos nossos padrões de produção e consumo. Realizada desde a década de 1970, a análise sobre o momento em que passamos a ficar em dívida com o planeta é chamada de “Dia da Sobrecarga da Terra”, Earth Overshoot Day, em inglês. A cada ano, o nosso saldo negativo com o planeta só tem aumentado. No ano de 1970, entramos no vermelho em 29 de dezembro; em 1975 no dia 28 de novembro; em 2016 no dia 8 de agosto; e neste ano no dia 1º de agosto. “Se não mudarmos nosso comportamento de consumo, a projeção é de que precisaremos de mais de três Terras antes de 2050. Esse é um dos motivos pelos quais precisamos cumprir o Acordo de Paris (de 2015). Mas, além de cobrar que os governos alcancem as metas de emissões, cada pessoa pode colaborar para diminuir o seu impacto negativo no meio ambiente com pequenas ações cotidianas”, explica Helio Mattar, diretor-presidente do Instituto Akatu, ONG que atua há 16 anos pelo consumo consciente, em entrevista ao Estadão.

O consumo excessivo e o desperdício de comida (um terço dos alimentos produzidos vão direto para o lixo) são algumas das razões que contribuíram para que chegássemos ao cenário atual. O principal fator, contudo, é o uso de combustíveis fósseis (que representam 60% da pegada ecológica da humanidade). Se a gente reduzisse pela metade o consumo de carbono, o Dia de Sobrecarga da Terra ocorreria em novembro. Segundo os especialistas, o consumo excessivo dos recursos naturais pode provocar escassez de água, erosão do solo, perda de biodiversidade, incêndios florestais, furacões, entre outros sérios problemas. “O Dia da Sobrecarga da Terra pode não apresentar diferenças da noite para o dia – você ainda tem a mesma comida em sua geladeira”, disse o CEO da Global Footprint Network, Mathis Wackernagel, em comunicado oficial. “Mas, os incêndios estão ocorrendo no oeste dos Estados Unidos. Do outro lado do mundo, os moradores da Cidade do Cabo tiveram que reduzir pela metade o consumo de água desde 2015. Essas são consequências de estourar o orçamento ecológico do nosso único planeta”.  

Ele destaca que usando os recursos futuros da Terra para operar no presente nós só aprofundamos a nossa dívida ecológica e colocamos em risco a nossa própria existência no planeta. “É hora de acabar com esse esquema e alavancar nossa criatividade para criar um futuro próspero, livre de combustíveis fósseis e sem destruição planetária.” De acordo com o levantamento da Global Footprint Network, países economicamente mais ricos utilizam mais recursos naturais que os países mais pobres. Se todas as pessoas do mundo vivessem como os Estados Unidos, por exemplo, seriam necessários quase cinco planetas. Se tomássemos a Alemanha como exemplo, seriam necessários mais de três planetas.  

Embora o Brasil ainda seja visto como uma espécie de “credor” de recursos naturais, devido ao fato dos recursos naturais disponíveis serem superiores à pegada ecológica individual de cada brasileiro, o país é apontado como o que consome recursos naturais em um ritmo mais acelerado que a média no mundo. Considerando somente os gastos com produção e consumo por aqui, o Dia de Sobrecarga da Terra seria em 19 de julho (e consumiríamos o equivalente a 1,83 planetas). Além disso, somos a nação que menos reaproveita resíduos – no ranking dos países que mais produzem lixo no planeta, nós estamos em quinto lugar. De acordo com levantamento da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), 20 milhões de toneladas de resíduos sólidos urbanos poderiam ser recuperados por ano com reciclagem – 25% do total do lixo gerado. Por conta de tudo isso, repensar nosso estilo de vida (como comemos, como bebemos, como nos vestimos, como nos locomovemos, como empreendemos) e a forma como lidamos com o nosso lixo é algo mais que necessário, é essencial e urgente!