Sim, temos aqui no Brasil um dos prédios que está na lista das melhores construções do planeta. E é com mais orgulho ainda que falamos sobre isso, afinal, é uma escola brasileira feita de madeira e localizada numa área remota, projeto do nosso professor Marcelo Rosenbaum.
Canuanã é uma escola rural em regime de internato mantida pela Fundação Bradesco. Um espaço que acolhe crianças e jovens entre 7 e 18 anos e que, durante todo esse tempo, cumpre vários papéis: é casa, família, abrigo, laboratório e sala de aula. Uma escola rural mantida há quase 40 anos, onde 540 crianças e adolescentes, filhos de caboclos e indígenas que moram na zona rural do centro oeste brasileiro, cujo deslocamento impossibilita a rotina escolar, sendo necessário o regime de internato. A instituição é um internato por necessidade: atende a região agrícola remota em torno do município de Formoso do Araguaia, onde os alunos fazem longas viagens a cavalo por estradas não pavimentadas para chegar lá. O isolamento também fez da construção um desafio.
A Vila das Crianças, como ficou conhecida, é feita de madeira e tijolos de barro, não precisa de ar-condicionado, mesmo com o calor de 45 graus, e ganhou, entre outros, o prêmio do Instituto Real dos Arquitetos Britânicos de 2018.
Foi eleita também vencedora do RIBA International Prize 2018 (como melhor edifício do mundo), do American Architecture Prize 2017 – categoria Habitação Social, Arch Daily – Building of The Year 2018, 4º Prêmio de Arquitetura Instituto Tomie Ohtake AkzoNobel 2017, 5º Prêmio Saint-Gobain de Arquitetura – Habitat Sustentável – categoria Edificação Institucional e Melhor Projeto da Edição, APCA 2017 – categoria Obra de arquitetura no Brasil, Prêmio IBRAMEM A MATA 2018 – categoria Profissional.
Sim! Uma longa lista de prêmios e uma demonstração de que, quando queremos, é possível transformar, utilizando técnicas locais e sem agredir o meio ambiente.
Legenda foto: O complexo é um modelo de design ambiental leve, proporcionando uma enorme extensão de sombra . Foto: Leonardo Finotti/Rosenbaum Arquitetura 2017.
A impressão é de que a floresta próxima tomou conta do prédio. São colunas de eucaliptos que se estendem dentro do amplo complexo de dormitórios da escola de Canuanã. Entre os troncos altos, há grupos de pequenas salas de tijolos de barro dispostas em torno de pátios abertos. Paredes perfuradas e respiráveis permitem ventilação cruzada natural.
No site do Projeto, o grupo de trabalho conta que “Fomos convidados pela Fundação Bradesco para repensar e qualificar as moradias dos estudantes na Fazenda Canuanã, em Formoso do Araguaia, Tocantins. O ponto de partida deste projeto foi a mudança do conceito de alojamento para o conceito de morada, através do uso da tecnologia social desenvolvida pelo Instituto A Gente Transforma, o Design Essencial, que entende a arquitetura como uma ferramenta de transformação social, capaz de conectar as crianças e jovens com os saberes dos seus antepassados.”
Segundo a diretora Fundação Bradesco, Denise Aguiar: “Escolhemos os arquitetos justamente porque eles não são do tipo que pensam que sabem tudo”
“Não sabíamos o que precisávamos, mas os designers pareciam realmente ouvir o que os alunos queriam, em vez de impor suas próprias ideias”. (Denise Aguiar)
O projeto começou com uma residência intensiva de 10 dias no local, quando os arquitetos se reuniram com alguns dos adolescentes para os quais estariam projetando, desenvolvendo jogos e oficinas para entender como os estudantes queriam viver juntos.
“Só podíamos transportar materiais leves para o local, por isso pré-fabricamos os elementos da estrutura de madeira, mas decidimos que os materiais pesados deveriam vir do próprio local”, diz Gustavo Utrabo, que fundou a Aleph Zero com seu ex-colega de classe Pedro Duschenes em 2012. Em entrevista ao The Guardian, ele conta: “O desafio era convencer os alunos e professores de que os materiais locais de terra, tijolos e madeira poderiam representar progresso – que ser moderno não significava vidro, aço e ar condicionado.”
Felizmente, Aleph Zero conseguiu. O complexo resultante é um modelo de design ambiental leve, proporcionando uma enorme extensão de sombra, sob a qual são organizados grupos de pequenos edifícios, com paredes perfuradas e respiráveis, permitindo ventilação cruzada natural. A única reclamação que os alunos fizeram é realmente sentir frio à noite, um problema facilmente resolvido com mais cobertores.
Os dormitórios estão agrupados em estruturas de tijolos de barro sem cozimento que foram fabricados na obra utilizando a terra da própria fazenda, assentados como muxarabi nas áreas de serviço, exatamente como nas casas da região, criando conforto térmico eficiente. A estrutura de Madeira Laminada Colada (MLC) foram produzidas com madeira 100% de florestas de reflorestamento, tecnologia com baixo impacto ambiental.
O paisagismo cria nos pátios o microclima resultante do encontro de 3 biomas – Cerrado, Amazônia e Pantanal e reconecta as crianças com a biodiversidade do local.
O espaço organiza as relações entre o publico e o privado, criando espaços de convívio entre o coletivo, a natureza e o indivíduo, reconecta as crianças e os jovens às suas origens como humanidade, com ligação viva em seu ecossistema de entorno.
“O principal objetivo do design era criar um lugar que pareça um lar longe de casa para as crianças”, diz Utrabo ao The Guardian. As instalações anteriores consistiam em dormitórios superlotados, às vezes dormindo 40 pessoas no mesmo ambiente. A nova casa oferece quartos para seis em beliches de madeira, dispostos em torno de pátios arborizados, conectados por um nível superior de passarelas de madeira e áreas de lazer, criando uma varanda arejada. Existem dois edifícios idênticos, um para meninos e outro para meninas, cada um com 165 metros x 65 metros de cada lado da escola, agora sendo usados de maneiras muito diferentes.
Destaque: “O melhor prédio novo do mundo. Precisa nos acordar do nosso estupor cotidiano para algo desafiador que nos ensina por que a arquitetura ainda é relevante.” (Elizabeth Diller – presidente do júri do Prêmio Internacional RIBA 2018)
Os edifícios ganharam vida própria. Foto: Leonardo Finotti / Rosenbaum Arquitetura | 2017
Utrabo e o grupo de trabalho da Rosembaum revisitou o projeto algumas vezes depois para acompanhar o uso do espaço e descobriu que os edifícios ganharam vida própria. As meninas começaram a organizar aulas de pilates e quem precisa estudar para os exames agora pode ter aulas extras nos arredores menos formais da vila, em vez de precisar voltar para a escola depois do horário.
O projeto foi o segundo vencedor do prêmio internacional bienal da RIBAO. Children Village venceu a concorrência do edifício O’Donnell & Tuomey da Universidade da Europa Central em Budapeste, da Escola de Música Toho Gakuen em Tóquio por Nikken Sekkei e das torres de apartamentos arborizados de o Bosco Verticale em Milão, de Stefano Boeri.
FICHA TÉCNICA
Tecnologia Social – Design Essencial A Gente Transforma
Arquitetura Rosenbaum + Aleph Zero
Projeto, fabricação e construção da estrutura de madeira Ita Construtora
Projeto de paisagismo Raul Pereira Arquitetos Associados
Projeto de luminotécnica Lux Projetos Luminotécnicos
Projeto de fundações Meirelles Carvalho
Consultoria em conforto térmico Ambiental Consultoria
Instalações Lutie
Lajes em concreto Trima
Construtora Inova TS
Gerenciadora Metroll
Design mobiliário Rosenbaum e o Fetiche
Material de registro e comunicação do projeto Fabiana Zanin
Fotos e filmes Leonardo FInotti Diego Cagnato Galeria Experiência