Publicado em

SOBRE O QUE AS PESSOAS ESTÃO FALANDO?

Por Carolina Bastos, curadora de conteúdo da Escola São Paulo

Sobre o que as pessoas estão falando? Pensando? Se questionando?

Nosso mindset está realmente mudando?

BlastU

Estivemos essa semana dentro da segunda edição do BlastU, acompanhando painéis, workshops e debates sobre empreendedorismo, inovação e tecnologia.

Quando ouvimos pessoas como Sérgio Leitão, do Instituto Escolhas, conversando com Oskar Metsalvat, da Osklen, sobre as mudanças e as quebras de paradigmas que estamos vivendo e outras que ainda precisamos viver, sinto uma verdadeira euforia. Porque não estamos sozinhos!

Quando cheguei na Escola São Paulo, há dois anos, esses mesmos assuntos e pensamentos já estavam no nosso radar. Mas eu realmente não via tantos eventos desse porte e com tanta gente interessante falando sobre possibilidades e ações que já estão acontecendo e que precisam urgentemente acontecer.

Quando marcas começam a se posicionar, como o caso da Osklen, que tem isso em seu DNA desde o começo, vejo uma força enorme de transformação se movimentando, engolindo antigos preconceitos e desbravando espaços fundamentais.

Educação

Aqui no Brasil, a educação tem um lugar vergonhoso na nossa vida. Apenas 10% da população tem acesso a um ensino digno, e, mesmo assim, ainda aquém do que vemos ao redor do mundo.

Quando Priscila Cruz, do Todos Pela Educação, nos conta dados concretos, como por exemplo, o impacto econômico que uma transformação na educação poderia causar, impulsionando em 2 pontos percentuais o crescimento de nosso PIB caso as metas que tanto discutimos fossem atingidas, fica na minha cabeça uma pergunta recorrente: como não estamos investindo melhor nisso? Sem contar as transformações que reverberariam dessa ação, como inclusão, diminuição da violência, entre tantos outros benefícios. E digo mais, porque quando falamos de investimento em educação de base, até o ensino médio, nossos valores, como país, são altos, mas pelos resultados, nossa administração dessas verbas anda bem equivocada. Claro que existem exceções, mas elas deveriam ser a regra. E, infelizmente, não estou aqui comentando nenhuma grande novidade.

Claudio Sassaki, o cofundador e presidente da plataforma de educação online Geekie, participou com Ricardo A. Madeira (Tuneduc), André Barrence (Google for Startups) e Paulo Batista (Alicerce Educação) de uma conversa inspiradora sobre “Educação Transformacional”, onde ele deixou claro que, em sua opinião, o caminho para melhorar a aprendizagem passa necessariamente pelo professor, e que “o uso de inteligência artificial para os alunos aprenderem sem os professores tem um impacto limitado”.

Segundo ele, sua empresa está trabalhando, por exemplo, em tecnologias que ajudem esses profissionais a economizarem tempo e a organizar tarefas em pequenos grupos de estudantes dentro da sala de aula.

Transformação digital

Com a transformação digital, como vamos lidar com tanto déficit? Com tanto desemprego?
Enquanto grande parte dos setores desaparecerão, em alguns setores estratégicos e que irão crescer nos próximos anos, sobram vagas, já que não existem profissionais qualificados para as mesmas.

E então, claro, me vem a pergunta, aquela que não quer calar, e que sei que está também na cabeça de muitas outras pessoas: como me preparar? O que preciso aprender, desenvolver? O que eu quero realmente transformar para termos um mundo possível para nós e para as próximas gerações?

Eventos como a BlastU, onde discute-se inovação e novas formas de fazer as coisas, fica claro que existem soluções, tanto tecnológicas quanto humanas, muito melhores do que as que usualmente são aplicadas a produtos e serviços que consumimos.

Economia criativa

A economia criativa, nossa área de atuação e pesquisa, tem se desenvolvido de maneira exponencial, e mesmo que essa palavra já esteja parecendo um pouco gasta, ela vai seguir aparecendo para nós, porque a velocidade das transformações nunca mais será a mesma. Se isso será bom ou ruim? Me parece que cabe a cada um de nós, nesse caso, fazer do seu limão uma limonada.

A palavra mais ouvida em todos os espaços era propósito. Por que fazemos o que fazemos? De médicos, cientistas, economistas, ativistas, educadores à publicitários e empreendedores… todos ali estavam falando sobre significado e direcionamento de energia para algo em que possamos realmente acreditar. Para mim, o sentimento comum era: “precisamos nos conectar e encontrar novos caminhos”.

Ficou muito claro que os que estavam ali compartilhando suas experiências, incluindo erros e acertos, estavam de peito aberto mostrando: “vejam o que eu sonhei, desenvolvi, participei, etc… e como foi possível chegar até aqui, olha tudo que deu errado, ou que ainda está dando, mas não quero desistir”.

Diversidade

Falou-se também de diversidade e inclusão, em conversas como a de Patrícia Villela, do Humanitas360 e Carolina Mellone Etlin, advogada, em um painel sobre “Empreendedorismo atrás e além das grades”, um tema pouco visto em eventos como esse. Ponto para a organização do evento.

Tracy Francis (a sócia da consultoria McKinsey) conversou com Carolina Videira (Turma do Jiló, associação que promove a educação inclusiva), e lembrou que ainda há desigualdade salarial, que a parcela de mulheres em cargos de liderança nas empresas ainda é muito menor que a dos homens e que é preciso que os homens se conscientizem e ajudem a mudar esse cenário.

Foi também lindo de ver a conversa entre nosso professor Marcelo Rosenbaum e Biraci Brasil, líder Yawanawa, falando com sinceridade e muita propriedade sobre oportunidades de novos negócios na floresta Amazônica, baseadas em saberes ancestrais, juntando inovação ao respeito pela tradição e a cultura de nossos índios.

Enfim, nesses dois dias de evento, não conseguimos ver tudo, claro, mas a amostragem foi positiva. Segundo os organizadores, o objetivo era disponibilizar ferramentas para os empreendedores e conectá-los a empresas e mentores. Conseguiram? Acho que em alguns dos painéis que acompanhei a empatia e a vontade de fazer parte de uma transformação na nossa sociedade era mais profunda do que o conteúdo, mas, mesmo assim, o evento me deixou com a sensação de que as pessoas e empresas estão cada vez mais entendendo o que e para onde precisamos ir. Juntos.

#escolasaopaulo #descubra #reinvente #viva

Publicado em

NEGÓCIOS COM PROPÓSITO PODEM AUMENTAR A LUCRATIVIDADE

Quando o lucro é aliado a um propósito

Você já ouviu falar em negócios sociais? O termo foi cunhado na década de 1970 pelo economista Muhammad Yunus. Ganhador do Prêmio Nobel da Paz, em 2006, ele é o fundador do Yunus Social Business Global Initiatives, um fundo de investimento sem fins lucrativos que transforma doações filantrópicas em investimentos em negócios sociais. A iniciativa tem uma unidade brasileira, a Yunus Negócios Sociais Brasil.

Desde a década de 1990, os negócios sociais foram ganhando cada vez mais adeptos no mundo, sobretudo nos EUA e na Europa. Segundo estimativa do banco de investimento JPMorgan Chase, os negócios sociais devem movimentar US$ 1 trilhão no mundo todo até 2020 – R$ 50 bilhões somente no Brasil. “Negócios sociais são empresas que têm como foco principal servir a base da pirâmide. O impacto social é o foco central do trabalho, mas, para isto, elas utilizam mecanismos de mercado, como a venda de produtos. Pode ser uma empresa que visa o lucro, no entanto, que tenha como sua atividade principal resolver um problema social”, explica Renato Kiyama, Gerente da Aceleradora de Impacto da Artemisia, em entrevista à Exame. A Artemisia é uma organização sem fins lucrativos, pioneira na disseminação e no fomento de negócios de impacto social no Brasil, que já acelerou mais de 100 negócios e já ofereceu capacitação para outros 300.

Negócios que tendem a crescer cada vez mais

A startup de compras on-line Welight é um exemplo. Criado em 2016, o negócio é um misto de empresa social e ONG e atua em três ferramentas: site, aplicativo e plug-in. Ao fazer uma compra pelo site ou pelo aplicativo da startup em uma das mil lojas parceiras da iniciativa, a Welight repassa entre 0,5% e 15% do valor do produto adquirido. Parte deste dinheiro vai para um dos 30 projetos sociais listados pelo site dedicados a questões de gênero, educação, combate à fome, meio ambiente, entre outras. A Welight fica com cerca de 10% do total arrecadado com as comissões para se manter. Todo o processo é auditável e fica disponível para os clientes. “Todas as relações de consumo podem ser uma geração de impacto social escalável. A ideia é globalizar a operação, já que desafios humanitários e ambientais existem em todos os lugares”, explica Pedro Paulo Lins e Silva, um dos criadores da iniciativa, em entrevista ao Draft.

Oportunidades não faltam

Outra iniciativa bastante interessante é a da Signa, que é atualmente uma das principais referências de educação online para surdos. Criada há dois anos, a startup oferece mais de 20 cursos, já atendeu mais de 1.300 alunos e tem um faturamento mensal de R$ 40 mil. A próxima etapa da empresa é abrir espaço para que os próprios alunos criem novos cursos (uma maneira da startup aumentar o portfólio de cursos e oferecer aos estudantes uma nova fonte de renda) e expandir a proposta para outros países. “O empreendedorismo é a resposta para melhorar a sociedade”, afirma Randall Kempner, diretor executivo da Aspen Network of Development Entrepreneurs (Ande), rede global de apoio a negócios de impacto social.

A iniciativa conta com 280 integrantes em todo o mundo e auxilia empreendedores em 150 países emergentes. Em entrevista à revista Pequenas Empresas e Grandes Negócios, ele explica que o Brasil ainda está descobrindo o potencial dos negócios sociais. Um estudo realizado pela Ande, em 2016, conseguiu identificar apenas 29 investidores de impacto locais, com US$ 177 milhões para investir, a maioria na região Sudeste. Ainda assim, ele espera que o levantamento deste ano irá apresentar um crescimento no número de adeptos ao modelo. “Eu gostaria que as grandes companhias percebessem que investir em negócios sociais pode ser uma grande oportunidade. Você tem a possibilidade de lucrar e causar impacto social nas áreas em que atua. Então, vá atrás disso, explore diferentes caminhos.”

Como criar novos modelos de negócios para o design no Brasil e pensar outras economias?

A FIA {oficina de artesãs} nasceu da vontade de repensar os laços entre mercado, artesãos, designers e consumidores.

Refletindo sobre formatos de comercialização tradicionais e em como minimizar os custos em toda a cadeia do artesanato para que o artesão pudesse ser mais valorizado, o projeto foi idealizado a partir de conversas durante oficinas ministradas na Casa da Economia Solidária pela designer Celina Hissa, diretora da marca Catarina Mina, para artesãs de Sobral (Ceará). 

Ao final das oficinas, com uma mini coleção criada e peças-piloto prontas para serem reproduzidas, veio à tona o principal desafio: como fazer com que aquelas peças, tão bonitas, feitas com tanto carinho e vontade chegassem até o consumidor final? E mais: como fazer com que as pessoas que se dedicaram ao artesanato – e que reinventaram seus processos – pudessem se sentir encorajadas, confiantes e seguras, inclusive financeiramente, com aquilo que produziram?

Juntas, Celina Hissa, Silvana Parente, do IADH, e Lívia Salomoni, especialista em marketing e comunicação, decidiram entrar no Catarse, mas de uma forma diferente. Por meio do financiamento coletivo, conseguiram 222 apoiadores e, em um mês, fizeram uma pré-venda de quase R$ 40.000,00. Assim foi dado o start financeiro para a primeira coleção. Hoje, a Fia tem uma pop-up no site da Catarina Mina, marca da designer Celina Hissa, que, em conjunto com a oficina de artesãs, criou coleções para marcas como a Neon e já fecharam parceria com a OppaDesign.

Segundo Eloisa Artuso, professora do curso online de Design Sustentável da Escola São Paulo, “O futuro da moda e do design precisam refletir a nova consciência de uma era em que designers e consumidores estão verdadeiramente preocupados com a pegada ecológica e social dos produtos. Precisamos finalmente entender que as coisas devem ser vistas a partir de outra perspectiva: onde ‘ser’ é mais importante do que ‘ter’. As mentes criativas podem combinar inovação e sustentabilidade para transformar comportamentos culturais e levar o consumo a um patamar de melhor qualidade para então conseguirmos fechar a equação de um planeta finito.”

#escolasaopaulo #descubra #reinvente #viva

Publicado em

CULTURA TAMBÉM É NEGÓCIO

Em 2017, a exposição Queermuseu: Cartografias da Diferença na Arte Brasileira se transformou em assunto nacional ao ser retirada às pressas do Centro Cultural Santander, em Porto Alegre, em resposta a fortes críticas de grupos conservadores que viram nas obras apologia a pedofilia e zoofilia. Os contrários à mostra também chamavam atenção para o fato dela ter recebido R$ 800 mil via Lei Rouanet, um dinheiro, segundo eles, mau empregado.

Composta por 223 obras da década de 1950 até a atualidade de mais 80 artistas (como Lygia Clark, Leonilson e Adriana Varejão), a mostra buscava refletir sobre como o que é considerado estranho e fora do padrão da sociedade pode contribuir com a arte. “Para tratar do impacto cultural conceitual, artístico e histórico da palavra queer, trago obras que não são queer. Que são formalistas, que não têm nenhuma relação com questões de gênero e sexualidade”, afirmou o curador Gaudêncio Fidelis, em entrevista ao UOL. “Tanto que a narrativa difamatória em torno da exposição foi criada a partir de cinco obras, não mais do que isso”, acrescentou.

Mesmo com a recomendação do Ministério Público do Rio Grande do Sul, que concluiu que a exposição não fazia nenhuma apologia à pedofilia, a exposição foi encerrada pelo banco quase um mês antes da data prevista, o que gerou uma carta aberta de artistas e profissionais de arte que se queixavam do “aumento do ódio, da intolerância e da violência contra a liberdade de expressão nas artes e na educação.”

Em resposta ao fechamento, mais de 1.600 se organizaram pela internet e fizeram um dos maiores financiamentos coletivos já realizados no país. A iniciativa arrecadou mais de R$ 1 milhão que foram utilizados para remontar a exposição no espaço expositivo da Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio de Janeiro (parte do valor foi aplicado em melhorias no próprio Parque). Realizada entre os meses de agosto e setembro de 2018, a mostra recebeu 40 mil visitantes. A iniciativa colocou em debate a possibilidade do crowdfunding ser uma saída para artistas e instituições viabilizarem, com o apoio do público, projetos culturais, especialmente aqueles que não conseguem patrocínio da iniciativa privada.

A realização de projetos culturais no país acontece, na maioria das vezes, por meio do apoio de empresa através da Lei de Incentivo à Cultura, mais conhecida como Lei Rouanet. Em vigor desde 1991, a lei oferece abatimento fiscal em troca do investimento privado em projetos culturais. Atualmente, representa 80% da verba investida em cultura pelo governo e funciona com base em três vertentes: o mecenato, o Fundo Nacional de Cultura (FNC) e os Fundos de Investimento Artístico (Ficarts). No entanto, o mecanismo mais aplicado é o de mecenato. O FNC, em tese, tem a função de oferecer suporte a projetos menos atraentes para o mercado, mas, por depender principalmente da verba do governo, não tem obtido bons resultados – em 2015, por exemplo, representou pouco mais de 2%, conforme aponta reportagem do Nexo sobre os acertos e erros da Lei Rouanet.

O financiamento coletivo para cultura no país já funciona de maneira eficaz com publicações de livros, pequenas exposições e produções de música, teatro e cinema, mas ainda é pouco empregado nas artes plásticas. Em países como os EUA, a maior parte do dinheiro que financia a cultura vem de pessoas físicas. O Lincoln Center, em Nova York, por exemplo, tem mais de 70% dos investimentos feitos por pessoas físicas. Os interessados podem doar de US$ 50 a US$ 30 mil. “Instituições e eventos de arte que possuem o potencial de atrair uma grande quantidade de público ou que defendem causas específicas devem estar atentos a essas oportunidades”, pontua o curador Daniel Rangel em artigo publicado na Folha de S.Paulo. “Quem sabe um dia teremos uma Bienal de São Paulo financiada inteiramente pelas pessoas. Ou a programação de um Masp, por exemplo. Isso liberaria a verba das empresas para projetos com menos apelo de marketing, propiciando maior democratização dos recursos”, acrescenta. Iniciativas de promoção à cultura são sempre bem-vindas.

É importante pontuar que a proposta é um incentivo a mais a um dos setores mais aquecidos do país atualmente: o da economia criativa. De acordo com dados do Ministério da Cultura (MinC), divulgados no primeiro semestre de 2018, as atividades culturais e criativas representam 2,6% do PIB nacional, geram um milhão de empregos diretos e englobam 200 mil empresas e instituições, o que representa mais de 10,5 bilhões em impostos diretos e tem crescimento médio anual de 9,1%. O Brasil é o segundo maior mercado de cinema da América Latina em receita e o maior em vídeo on demand, TV Paga, games (deve dobrar em receita até 2021) e música. Mais que um dos principais ativos do país, a cultura é o canal por meio do qual cada pessoa tem a oportunidade de desenvolver o senso crítico e, por consequência, se tornar um melhor profissional e um cidadão mais consciente do seu papel no mundo.

Na Escola São Paulo, acreditamos que a economia criativa é um agente de transformação e que, por meio dela, podemos, juntos, repensar futuros possíveis. Estamos todos conectados, e todas as nossas ações profissionais e pessoais, afetam não só nossa carreira, mas o mundo como um todo.

#escolasaopaulo #descubra #reinvente #viva

Publicado em

O PLÁSTICO NO FUTURO

A imagem é chocante: uma gigantesca camada de lixo plástico boiando no oceano, reflexo direto dos nossos hábitos de consumo e descarte, um sinal claro de que devemos rever urgentemente nossas atitudes. O registro é da chamada Grande Mancha de Lixo do Pacífico, uma área descoberta na segunda metade da década de 1980, localizada entre a costa ocidental dos EUA e o Havaí, que acumula resíduos levados pelas correntes marítimas, muitos deles plástico.

De acordo com levantamento da fundação holandesa The Ocean Cleanup, a mancha tem cerca de 80 mil toneladas de plásticos descartados em uma área quase duas vezes e meia maior que o território da França. O estudo coletou 1,2 milhão de amostras e selecionou 50 itens com data de fabricação legível. O resultado? Havia plástico de 1977 e das décadas de 1980 e 1990. Além disso, a pesquisa identificou que a maior parte do 1,8 trilhão de peças presentes na mancha é composta por pedaços pequenos que medem menos de meio centímetro. “Um relatório de 2016 da Organização das Nações Unidas (ONU) estima que mais de 800 espécies marinhas e costeiras são afetadas pela ingestão desses plásticos”, explica a pesquisadora Daniela Gadens Zanetti, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em entrevista à revista Planeta. “Além disso, esses resíduos têm um efeito adverso nas indústrias de pesca, navegação e turismo. O relatório da ONU avalia o custo da poluição causada por detritos marinhos em US$ 13 bilhões”, acrescenta.

Muito além do canudinho

No ano de 2014, foram fabricadas 311 milhões de toneladas de plástico. Caso não mudemos os rumos, em 2050, serão produzidas 1,124 bilhão de toneladas. Uma quantidade gigantesca de plástico que demorará anos para desaparecer. Plásticos usados em embalagens de água e refrigerantes, por exemplo, levam até 200 anos para se decompor. Já os utilizados na fabricação de talheres e cartões de crédito de seis meses a dois anos. “Bactérias e fungos que decompõem os materiais não tiveram tempo de desenvolver enzimas para degradar a substância”, explica a engenheira química Marilda Keico Taciro, do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), em entrevista à revista Superinteressante. “Com a evolução, os microorganismos devem se adaptar, mas isso pode levar milhões de anos”, acrescenta o biólogo José Gregório Cabrera Gomes, também do IPT, na mesma publicação.

Nossos números assustam

Segundo dados do estudo feito pelo Fundo Mundial para a Natureza (WWF) o volume de plástico que chega aos oceanos anualmente é de aproximadamente 10 milhões de toneladas, o equivalente a 23 mil aviões Boeing 747 pousando nos mares e oceanos todos os anos.

Nesse ranking, o Brasil é o 4º maior produtor de lixo plástico do mundo, atrás apenas de Estados Unidos, China e Índia. Esse número foi divulgado no relatório “Solucionar a Poluição Plástica – Transparência e Responsabilização” apresentado na Assembleia das Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEA-4) em Nairóbi, no Quênia, em março de 2019.

Além disso, segundo esse mesmo estudo, somos um dos países que menos reciclam no mundo. No caso do plástico, reciclamos 145.043 toneladas, ou seja, apenas 1,2%, bem abaixo da média mundial, que é de 9%.

Veja mais alguns números:

  • Cada brasileiro produz 1 kg de lixo plástico por semana
  • O Brasil produz 11.355.220 milhões de toneladas de lixo plástico por ano
  • 2,4 milhões de toneladas de plástico são descartadas de forma irregular
  • 7,7 milhões de toneladas ficam em aterros sanitários

Alternativas em curso

Já temos no mercado um plástico biodegradável chamado PHB que vira pó em seis meses nos aterros sanitários. Mas a sua fabricação custa até cinco vezes mais que os plásticos comuns e, portanto, ainda o torna inviável na prática (atualmente, ele responde por apenas 1% do total de plástico vendido no mundo). Recentemente, os engenheiros chilenos Roberto Astete e Cristian Olivares anunciaram a criação de sacolas plásticas e de tecido solúveis em água e que não contamina, uma vez que não levam petróleo em sua composição. “Nosso produto deriva de uma pedra calcária que não causa danos ao meio ambiente”, assegurou Astete, diretor-geral da empresa SoluBag, conforme reportagem do portal UOL. “É como fazer pão”, acrescenta. “Para fazer pão é preciso farinha e outros ingredientes. Nossa farinha é de álcool de polivinil e outros componentes, aprovados pela FDA (agência americana reguladora de alimentos, medicamentos, cosméticos, aparelhos médicos, produtos biológicos e derivados sanguíneos), que nos permitiu ter uma matéria-prima para fazer diferentes produtos.”

Após a diluição dos produtos, o que fica na água é carbono, elemento que não afeta a sua qualidade. A iniciativa inovadora ganhou o prêmio SingularityU Chile Summit 2018 como empreendimento catalizador de mudança e rendeu aos inventores um estágio no Vale do Silício em setembro de 2018. A proposta ainda está em estágio inicial e não pode ser considerada uma solução definitiva para a questão.

Nada se perde, tudo se renova

O mal causado pelo plástico nos oceanos é um problema real e urgente que mobilizou a opinião pública e governos e fez com que diversas empresas apresentassem ações visando não apenas a redução do consumo de plástico, como também a readequação da sua cadeia produtiva para esta finalidade. Baseando-se na lógica da economia circular, essas empresas estão se adequando para produzir de maneira modular, de modo a reaproveitar ao máximo os elementos que compõem o seu processo de produção e gerar menos impacto ao meio ambiente. Nada se perde, tudo se renova.

A cervejaria dinamarquesa Carlsberg anunciou recentemente que irá colar as latinhas ao invés de utilizar o invólucro de plástico em seus conjuntos de seis unidades. A cola utilizada no processo é uma espécie de goma de mascar que não gruda nos dedos. A expectativa da empresa é reduzir em até 76% o plástico utilizado (uma economia de 1,2 mil toneladas de plástico por ano). Batizada de Snap Pack, a novidade entrou em vigor em setembro no Reino Unido e na Noruega e deverá chegar em breve nos demais mercados de atuação da marca.

O mercado da moda também está se transformando, pressionado por consumidores mais conscientes. Em parceria com a organização Parley for the Oceans, a Adidas lançou pares de tênis feitos com plástico retirado dos oceanos (cada par utiliza 11 garrafas de plástico que são transformadas em uma espécie de fibra). A novidade rendeu mais de um milhão de vendas e se desdobrou na fabricação de camisas de futebol (adquiridas por times como Real Madrid e Flamengo). A empresa pretende, até 2024, produzir produtos apenas com plástico retirado dos mares.

Reconhecida pelo seu foco em ações sustentáveis, a designer Stella McCartney anunciou a utilização de plástico dos oceanos em suas criações graças, também, a uma parceria com a Parley for the Oceans. “Quando eu era mais nova, couro era sinônimo de luxo, e as pessoas não aceitavam que eu não usasse couro nas minhas peças. O couro é mais barato do que outros produtos alternativos, é menos interessante, menos moderno. Será que um plástico reciclado será pensado como luxo algum dia? Se as pessoas perceberem que viver por mais tempo neste planeta é um luxo, então sim, essa é a minha ideia de luxo”, declarou a estilista em entrevista ao The New York Times.

Até 2020, a Starbucks vai deixar de usar canudos de plástico substituindo-os por materiais menos poluentes. A empresa também vai passar a utilizar copos que não demandem o uso do objeto plástico. O objetivo da rede é que mais de um bilhão de canudos deixem de ser usados por ano graças à medida. Vale lembrar que o tempo de decomposição de um canudo plástico é de 500 anos. Empresas como Nestlé e PepsiCo também estão sendo pressionadas por seus investidores a implementarem ações semelhantes.

Design Circular

Eloisa Artuso, designer, pesquisadora e diretora educacional do Fashion Revolution Brasil, desenvolve seu trabalho baseado no lugar onde sustentabilidade, cultura e comunicação se fundem com o design.

O designer sustentável tem um papel crucial na implementação de novos processos e sistemas mais sustentáveis. Ele enxerga a sustentabilidade como uma possibilidade criativa, e não limitadora. Traz para sua prática um olhar ativista. Se entende como criador de mensagens, como um propulsor e propagador de novos modelos de produção e de consumo, em um papel muito importante no desenho de novos futuros e de futuros mais sustentáveis.

Segundo Eloisa, o papel do designer vai muito além do que criar produtos. Vê o designer num papel de criar novos sistemas, novos processos e novos futuros onde estes produtos estarão incluídos.

Em nosso curso online de Design Sustentável, ela traz o design como um dos agentes de transformação da situação que enfrentamos, utilizando as 5 ferramentas para o design circular: design para longevidade, design para serviços, design para reuso, design para desmontagem e design para recuperação.

“É o dever de cada um de nós garantir que a busca pela prosperidade material não comprometa nosso meio ambiente. As escolhas que fazemos hoje definirão nosso futuro coletivo. As escolhas podem não ser fáceis. Mas através da conscientização, da tecnologia e de uma parceria global genuína, tenho certeza de que podemos fazer as escolhas certas.”

Primeira ministra da Índia, Narendra Modi

#escolasaopaulo #descubra #reinvente #viva

Publicado em

A FACULDADE DO FUTURO

No atual mercado de trabalho, todo conhecimento é válido

Em um mercado de trabalho cada vez mais concorrido, qualificação profissional (diploma universitário) é um quesito indispensável, correto? Não necessariamente, ao menos para as mais importantes empresas de tecnologia do mundo, como Google, Apple e IBM. A informação consta em um levantamento feito pelo site de busca de empregos Glassdoor. Além das gigantes de tecnologia, figuram na listagem empresas como Hilton, Whole Foods, Starbucks e Bank of America.

Não que elas desconsiderem a formação tradicional ao contratarem seus colaboradores, muito pelo contrário. Mas, cada vez mais, estão ampliando o seu leque de análise e considerando a qualificação de profissionais sem diploma universitário em seus processos seletivos. A mudança de comportamento tem uma motivação prática: o número de vagas no setor é superior à quantidade de candidatos. Além disso, o desenvolvimento de setores como o de Tecnologia tem motivado o desenvolvimento de novas habilidades e a criação de “novos empregos”.

Um outro modelo de formação

A vice-presidente de talentos da IBM, Joanna Daley, declarou ao site CNBC Make it que, em 2017, cerca de 15% das contratações de sua empresa nos EUA não têm graduação de quatro anos. Segundo ela, em vez de olhar exclusivamente para candidatos que foram para a faculdade, a IBM agora avalia também os candidatos que têm experiência prática por meio de bootcamps (programas de ensino imersivo que focam nas habilidades mais relevantes de determinada área), outros empregos ou mesmo por esforço próprio. Na visão da empresa, cursos livres ou vocacionais e a experiência adquirida no trabalho muitas vezes são mais eficazes do que o conhecimento adquirido em quatro anos de universidade, por exemplo.

De acordo com levantamento da Associação de Controle e Auditoria de Sistemas de Informação dos EUA (Information Systems Audit and Control Association, em inglês), 55% dos recrutadores da área consideram a experiência prática a qualificação mais importantes. “Os ‘novos empregos’ não apenas trazem candidatos que constroem habilidades através de outros campos de conhecimento, mas também profissionais mais velhos ou aposentados que retornam ao mercado de trabalho”, afirma Joanna.

Seres humanos excepcionais

Em 2004, o então vice-presidente de Recursos Humanos da Google, Laszlo Bock, declarou em entrevista ao The New York Times que a companhia priorizava a capacidade cognitiva geral do candidato, não o seu quociente de inteligência. “É a capacidade de aprender. É a capacidade de processar na hora. É a capacidade de reunir diferentes tipos de informações”, disse. “Quando você olha para pessoas que não fazem faculdade e, mesmo assim, fazem o seu caminho no mundo, elas são seres humanos excepcionais. E devemos fazer tudo o que pudermos para encontrar essas pessoas. Muitas faculdades não cumprem o que prometem. Você gera uma tonelada de dívidas e dúvidas, você não aprende as coisas mais úteis para a sua vida. É [apenas] uma adolescência prolongada”, acrescentou.

A Escola São Paulo pensando no futuro

A Escola São Paulo é, desde 2006, um espaço democrático de compartilhamento de experiências e de conhecimento, a favor de iniciativas que promovam o diálogo e o respeito às diferenças e que contribuam para que a gente possa viver em uma sociedade mais justa, respeitosa e generosa. Não acreditamos em verdades absolutas. A nossa proposta é fazer um convite à reflexão. A partir dessa responsabilidade procuramos profissionais atuantes no mercado e produzimos cursos com conteúdos que a gente tem curiosidade em estudar e acredita que são relevantes e que vão acrescentar alguma coisa na vida das pessoas.

Em um mundo em constante transformação como o nosso, um diploma de graduação já não é garantia de sucesso. No atual mercado de trabalho, mais importante que um certificado acadêmico é o conhecimento adquirido por cada profissional, seja pelos métodos tradicionais ou por vias menos convencionais.

#escolasaopaulo #descubra #reinvente #viva

Publicado em

PERIFERIA EMPREENDEDORA

Em 2012, inspirado pelo livro O banqueiro dos pobres, do economista Muhammad Yunus (criador do termo Negócios Sociais), o jovem Thiago Vinícius criou o Banco Comunitário União Sampaio, no Capão Redondo, bairro onde mora na periferia de São Paulo. O capital de giro inicial foi de R$ 20 mil, captados via crowdfunding. A iniciativa funciona com duas carteiras, uma produtiva e outra para consumo. A primeira opera em reais, com juros de até 2%, e segunda com o Sampaio, moeda criada pela instituição, sem juros, que é aceita por diversos estabelecimentos da zona sul paulistana. Desde sua criação, o banco já movimentou mais de R$ 1 milhão.

Presidente da Associação das Mulheres de Paraisópolis, na zona sul paulistana, Elizandra Cerqueira criou o Bistrô & Café Mãos de Marias, iniciativa que, desde 2017, oferece cursos de capacitação e empreendedorismo para mulheres do bairro. Além disso, mantém uma horta orgânica de onde as cozinheiras tiram os ingredientes para fazer os pratos vendidos no espaço (o cardápio é composto por iguarias da culinária nacional, como virado à paulista, feijoada, bobó de camarão e moqueca de peixe, entre outros). O Bistrô tem o objetivo de apoiar as mulheres de Paraisópolis – atualmente, elas representam 53% da população local e chefiam 20% das famílias do bairro.

Thiago e Elizandra integram o grupo de quase 18 milhões de empreendedores das classes C, D e E que movimentam mais de R$ 228 bilhões por ano no país, segundo o Instituto Locomotiva e o Data Favela. Segundo levantamento da consultoria Data Popular, na última década, os negócios movimentados entre os 12,5 milhões de moradores de favelas geraram R$ 68,5 bilhões de renda anual. Um mercado cada vez mais forte e diverso que tem impactado diretamente os índices econômicos nacionais. “A periferia é a base da economia solidária”, afirma Thiago, em entrevista à revista Pequenas Empresas & Grandes Negócios.

Apesar dos números expressivos, os empreendedores da periferia ainda sofrem preconceito do mercado e têm dificuldade para encontrar investidores que os auxiliem a colocar os seus projetos em prática. “Muitos acreditam que quem mora nas periferias não tem muito conhecimento. Não levam muita fé no nosso trabalho”, afirma Elizandra, em entrevista à Pequenas Empresas & Grandes Negócios.

Mesmo diante destes entraves, é cada vez maior o número de iniciativas em curso com o objetivo de auxiliar projetos empreendedores das periferias das grandes cidades brasileiras. A Artemisia é uma delas. Dentre os projetos já apoiados pela aceleradora de negócios de impacto social está a boutique Krioula, criada no Capão Redondo, em São Paulo, que vende turbantes, colares, anéis e brincos inspirados na cultura afro. “Queremos focar o nosso trabalho cada vez mais nas regiões periféricas porque potenciais não faltam”, afirma Priscila Martins, gerente de relacionamento institucional da Artemisia, em entrevista à revista Época Negócios.

O Fundo de Aceleração para o Desenvolvimento Vela (FA.VELA), de Belo Horizonte, Minas Gerais, é outro espaço que vem auxiliando empreendedores da periferia. Em entrevista ao jornal Brasil Econômico, o presidente e cofundador da iniciativa, João Souza afirma que, somente em fevereiro de 2017, 48 negócios foram gerados para garantir o crescimento e a sustentabilidade das iniciativas lideradas pelos 35 empreendedores periféricos. Atualmente, já foram acelerados 122 negócios e formados mais de 130 empreendedores. De acordo com o Fundo, 42% atuam na área de serviços, 40,3% em fabricação de alimentos/artesanato e 17,7% na área comercial. “A gente tenta fortalecer este perfil empreendedor do morador de periferia democratizando o acesso a conhecimentos e a ferramentas que o ajudam a modelar melhor esse negócio, esse projeto que ele quer tocar e pensar a médio e longo prazos”, explica Tatiana Silva, diretora de projetos do FA.VELA, em entrevista à TV Globo de Minas Gerais.

Retratar como moradores da periferia de São Paulo estão transformando a realidade de suas comunidades com iniciativas inovadoras em áreas como gastronomia, comunicação e moda é o principal objetivo do documentário Visionários da Quebrada. “Acreditamos nas mudanças estruturais vindas das margens, nos saberes das periferias e na potência das pessoas engajadas na construção de suas comunidades. É um convite para atravessarmos as pontes que já estão construídas”, explica, explica Ana Carolina, idealizadora e diretora do filme.

Em visita ao Brasil em 2019, Barack Obama causou furor e comoção, falando sobre diversidade de direitos e oportunidades.

“Se houver apenas homens que pensam da mesma forma, as lideranças acabam perdendo informações”, e aqui acrescentaríamos: se não ampliarmos nossos olhares estaremos todos perdendo grandes profissionais, empreendedores, criativos, desenvolvedores, desbravadores dessa nova economia que está nascendo.

Continuar lendo PERIFERIA EMPREENDEDORA

Publicado em

PRODUTOS E SERVIÇOS VOLTADOS PARA O FUTURO

Por Sabina Deweik, professora da Escola São Paulo dos cursos de

Cool Hunting” e “Os Novos Paradigmas do Futuro e as Tendências Emergentes

O que uma marca precisa para ser relevante? Como radiografar a realidade e direcionar a bússola que nos dá a rota para saber, por exemplo, como empreender, como falar com o consumidor em um mundo repleto de novos comportamentos e mudanças? Vivemos o tempo todo uma espécie de FOMO (sigla em inglês que quer dizer Fear of Missing Out), a crescente síndrome da contemporaneidade na qual estamos o tempo todo com a sensação de que não sabemos o que escolher porque parece que sempre estamos perdendo uma enormidade de oportunidades.

Como caçadora de tendências, estudando, observando e captando movimentos e comportamentos há mais de 18 anos, aprendi a olhar não apenas para os movimentos passageiros, mas também para aqueles que têm uma maior duração. Como Cool Hunter, acompanho os chamados “Trend Reports” (relatórios de tendências) e percebo que, na realidade, o que é apresentado como um novo movimento, muitas vezes é apenas a evolução de um comportamento manifestado de outra forma. As tendências podem causar o tal do FOMO. São tantos os novos comportamentos que uma empresa, uma marca, pode ficar perdida e não saber o que escolher para aplicar em seu negócio. Por isso, ao invés de falar apenas de tendências, olhamos para os chamados Paradigmas do Futuro, que já são a certeza de que um movimento pode durar 20 anos. É aí que sentimos o JOMO (Joy of Missing Out), que prega justamente a alegria de não escolher todas as opções.

Os Paradigmas são novas forças que direcionarão o mercado e a sociedade: são novos parâmetros culturais, comerciais, empreendedoriais que estão trazendo uma verdadeira mudança radical na construção do futuro. Eles representam as novas direções. São linhas guia para o desenvolvimento de todas estratégias e projetos de empresas, instituições e consumidores. Um paradigma é uma mudança no imaginário coletivo mundial, uma nova consciência global da qual marcas, instituições, organizações ou indivíduos não podem escapar. Diferente de uma macro tendência, os paradigmas têm um núcleo de estabilidade maior, portanto, têm uma duração no tempo também maior. Os paradigmas perduram por até 20 anos ao passo que as macro tendências tem uma vigência de 6/7 anos.

Os paradigmas apresentados abaixo representam as chaves de leitura para compreender as tendências e suas evoluções no tempo. É como uma moldura, um frame que enquadra múltiplos comportamentos que conversam com o mesmo impulso. Eles são fruto de mais de 20 anos de observação e monitoramento de comportamentos em diferentes setores (são baseados em minha experiência com o renomado instituto de pesquisa de tendências e consultoria estratégica Future Concept Lab, com sede em Milão).

O conhecimento dos paradigmas nos dá a possibilidade de entendimento de inúmeros comportamentos. Sendo assim, para um único paradigma, podem existir inúmeras tendências coexistindo. Como afirma Francesco Morace no livro “O que é o Futuro?”, os paradigmas não são apenas dimensões descritivas e analíticas, mas sim dimensões conceituais e geradoras por meio das quais é possível imaginar projetos e produtos voltados para o futuro.

Então vamos comigo conhecer essas 4 forças que trazem clareza e foco: Crucial & Sustainable, Trust & Sharing, Quick & Deep, Unique & Universal.

Crucial & Sustainable

Esse paradigma diz respeito ao tema da sustentabilidade que está moldando o futuro do nosso planeta e de todos os consumidores do mundo.

O paradigma Crucial & Sustentável é expresso por meio da:

  • vontade e da necessidade de uma nova ética em torno da sustentabilidade
  • capacidade de devolver e oferecer recursos “fundamentais” por meio de valores que tem relevância;
  • necessidade de nutrir comportamentos e modos de pensar que possam minimizar o impacto negativo no ecossistema;
  • sensibilidade rumo a uma mudança ligada a recuperação da consciência coletiva (que não é mais somente de elite) relacionada com o meio ambiente como prioridade;
  • noção de que ser sustentável não é apenas um pensamento ecológico mas também social;
  • combinação entre ética e estética. A nova sustentabilidade é criativa, inovadora e gera desejo.

O Crucial & Sustainable é “Voltar às origens, protegendo ao longo do tempo tudo aquilo que nos circunda: nosso patrimônio econômico, ambiental e, ao mesmo tempo, também social e cultural. Redescobrir a importância dos recursos essenciais, que demonstram ter um papel decisivo em nossas vidas.”, diz Francesco Morace no livro “O que é o futuro?”

Dica:

Se uma empresa quer se manter relevante nos próximos 20 anos, ela precisa refletir em como sua marca pode pensar no coletivo maior. Essa era de transição é definida pela busca dos sentidos e do propósito. “As marcas podem ser disruptivas mas também com um impacto social. Se uma marca pensa e age na era industrial, ela está em um tempo diferente do que vive o seu consumidor”.

Um exemplo é a Tesla que faz carros elétricos com custo baixo e está mudando a mobilidade urbana e impactando o planeta positivamente. O erro está em ver o negócio como uma fábrica gigante de produzir produtos ao invés de cuidar de sistemas humanos reais.

Quick & Deep

Esse paradigma diz respeito a qualidade do futuro que estará cada vez mais em sintonia com a ideia de respeito pelas pessoas normais, pelos consumidores, em busca de experiências felizes, sem perseguir a quimera do luxo. A capacidade de ser rápido, oportuno e acessível deverá ser conciliada com a ideia de felicidade e profundidade de experiência.

O Paradigma Rápido & Profundo enfatiza:

  • a demanda por produtos e serviços simples e eficazes;
  • a capacidade de satisfazer as demandas de uma forma precisa, direta, eficaz e, sobretudo rápida;
  • a necessidade de visar o cumprimento do pedido do cliente que tem sempre menos tempo e mais conhecimento;
  • o desejo de receber de forma rápida e fácil, objetos a qualquer hora do dia ou da noite;
  • a felicidade por meio da fruição e do imediatismo de uso;
  • criar atalhos, acessibilidade e estar onde seu cliente está, entendendo que o tempo hoje é o maior luxo que temos;
  • a noção de que preço e valor são coisas diferentes. Nem sempre, aquilo que tem um preço alto tem um valor alto para o consumidor. Hoje, há experiências acessíveis de grande intensidade para o consumidor.

Segundo o sociólogo Francesco Morace, “é este o paradigma ligado à qualidade do cotidiano, no qual emergem com força os temas da felicidade e da oportunidade”.

Dica:

Acessibilidade com qualidade. O futuro pede pelo cruzamento destas duas dimensões. Um bom exemplo é a o serviço Rent The Runway, que recentemente anunciou uma parceria com o varejista de itens para casa West Welm. A partir da ideia de que a casa costumava ser um lugar privado, mas agora é um lugar público, ou seja os interiores são hoje flexíveis e instagramáveis, é possível combinar qualidade e rapidez. A parceria responde às mudanças de comportamento dos Millennials, que usam produtos de interiores para ter controle criativo sobre espaços alugados. Já que os Millennials e a Geração Z estão constantemente postando fotos de si mesmos em suas casas no Instagram, há uma necessidade de mudança dos interiores sem um custo alto. O serviço atende essa necessidade Quick & Deep.

Aqui vale uma observação sobre instagramável. Em nosso curso online de Arquitetura e Urbanismo, Mila Strauss e Marcos Paulo Caldeira explicam mais sobre esse conceito e mostram como os arquitetos estão incluindo em seus projetos o conceito de instagramável.

Trust & Sharing

O futuro é caracterizado por uma relação muito mais próxima e de confiança, não só com a marca, mas também com toda a empresa em seu complexo orgânico. As grandes empresas terão um novo papel de liderança e responsabilidade social e cultural muito além de seu produto. O compartilhamento irá encontrar a sua importância entre o real e o virtual e a explosão de novas tecnologias e a acelerada afirmação das redes sociais têm papel relevante na transparência da mensagem.

O Paradigma Trust & Sharing reforça a necessidade futura de:

  • renovar a lealdade e o compartilhamento;
  • atingir uma convergência entre o consumidor e a empresa;
  • gerar uma cadeia de valor que é baseada na integração entre o fabricante e o consumidor;
  • confiar uns nos outros;
  • compartilhar sensações e impressões;
  • desenhar o mais alto grau de felicidade à partir da experiência mais comum de produto e serviço;
  • sentir-se, como fabricante e como consumidor, no mesmo barco chamado Marca;
  • assumir a confiança como um pilar do compartilhamento seja no território real, seja no território virtual.

O paradigma Trust & Sharing, segundo Francesco Morace no livro “O que é o Futuro?”, “redefine uma cadeia de valor que toma forma atravessando todos os setores da sociedade e do mercado: a reciprocidade das relações repropõe uma economia das “não equivalências”, regenerando uma relação baseada na lealdade e no compartilhamento entre as pessoas, instituições, empresas e consumidores”.

Dica:

Com a possibilidade de compartilharmos cada vez maior, torna-se essencial o item confiança e transparência. A Yellow é um ótimo exemplo de Trust & Sharing — os patinetes compartilhados que tomaram conta das ciclovias, calçadas e ruas em uma grande parte das capitais brasileiras. O serviço vai crescer ainda mais: a Uber, por exemplo, pretende chegar ao mercado brasileiro com bicicletas e patinetes ainda neste ano. O modelo é apostar na confiança. Os patinetes ficam soltos nas ruas e o usuário desbloqueia seu uso pelo app. A localização é compartilhada no aplicativo para saber onde está o veículo. Depois que você usa, outra pessoa pode utilizar o patinete. Um modelo cada vez mais crescente de pensar os negócios desafiando o antigo sistema do fazer individual e da propriedade privada.

Unique & Universal

Esse paradigma diz respeito a capacidade de produzir e comunicar uma identidade única e distinta, inclusiva e não exclusiva, fundada na dimensão cultural de sua história, de sua identidade. Em um mundo global, torna-se essencial negócios ou pessoas que assumem seu caráter único, sua personalidade, sua maneira única de ser e se expressar no mundo seja como marca ou como ser humano. A diversidade constitui a condição do sucesso dos negócios no futuro.

Por meio do paradigma Único & Universal:

  • a antinomia entre o local e o global será deixada permanentemente para trás;
  • será reconhecido o valor dos produtos únicos e locais;
  • produtos locais serão transformados em opções globais;
  • o caráter distintivo das origens e dos processos será comunicado de modo mais transparente;
  • as mídias sociais serão usadas a fim de criar novas lógicas de distribuição e de comunicação, dando aos produtos locais uma melhor oportunidade de se afirmarem no mercado global;
  • customizado, personalizado, distinto passam a ser conceitos relevantes.

“As empresas e os profissionais que desejem conjugar o paradigma Unique & Universal deverão compreender que a demanda, cada vez mais universal, será suprimida no futuro por ofertas cada vez mais exclusivas”, nos diz Francesco Morace em “O que é o Futuro?”.

Dica

O caráter único é o que diferencia. A diversidade não é momentânea, não é tema de nicho, ela permite a inclusão de quem ficou a parte durante muito tempo. É o ponto de partida para ficarmos mais perto das pessoas e do consumidor. Um exemplo é o reposicionamento da Mattel, fabricante da famosa boneca Barbie, que nos anos 80 refletia um modelo de consumo aspiracional, com uma única boneca magra, alta, loira. Trazendo o novo paradigma, a Mattel trabalha hoje com uma gama de bonecas com diferentes biotipos para se comunicar com essa nova geração.

Saiba mais!

Para se aprofundar nesse universo de pesquisas e análises de tendências, Sabina Deweik desenvolveu com a Escola São Paulo o curso online “Os Novos Paradigmas do Futuro e as Tendências Emergentes”, onde conta mais sobre cada um dos paradigmas citados acima e relaciona cada um deles com tendências emergentes!

#escolasaopaulo #descubra #reinvente #viva

Publicado em

O QUE É COOL HUNTING?

Um mercado de tendências

O Cool Hunting é um método válido de pesquisa, que proporciona captar comportamentos antes que sejam massificados, e lançar uma inovação que possa ser absorvida pelo consumidor, além de funcionar como uma ferramenta dentro das organizações.

Não é à toa que percebemos pessoas interessadas no futuro, nas tendências, em previsões, pesquisas e tudo que anda saindo na mídia sobre as mudanças que estamos vivendo.

Entender o que vem por aí, e a força com que as mudanças acontecerão é parte estratégica de muitas marcas que pensam em seus produtos e serviços.

Os Cool Hunters trabalham para isso: para captar os sinais que a sociedade emite, interpretá-los e entrega-los às marcas como insights para inovação.

Todo mundo hoje tem muito mais acesso à informação. A grande diferença do cool hunting para a análise de tendências é saber interpretar e correlacionar todo esse mar de conteúdo.

Hoje, é uma profissão, amanhã, uma habilidade.

O que é cool?

Cool é normalmente associado com modas e tendências. Às vezes, cool é equivalente a trendy, mas em todo caso está relacionado com originalidade e inovação – características que podem determinar o sucesso de um projeto. Produtos, elementos surpreendentes podem inspirar os consumidores.           

Portanto, primeiramente, precisamos entender melhor o fenômeno global e suas expressões locais, depois propor soluções que possam atender ou exceder os desejos do consumidor. A observação 360 graus do que está acontecendo nas ruas do mundo, as escolhas das pessoas no que se refere a moda, design, tecnologia, etc.., os eventos e os lugares de interesse nas cidades, são importantes para compreender o que é realmente único.

Cool Hunters

Em particular, o Future Concept Lab começou a contratar, em 1994, jovens profissionais e pesquisadores ao redor do mundo, capazes de ser uma espécie de “antena” sensível em um território específico, participando de projetos de observação e de pesquisas internacionais. O FCL iniciou seu observatório com 5 metrópoles – Londres, Paris, Milão, Tokyo e Nova York. Hoje, são 40 cidades ao redor do mundo, algumas chamadas cidades periféricas, que estão influenciando o consumo emergente. Assim, os correspondentes são uma janela para o a cena mundial.

Outras grandes empresas, como a WGSN e a Box 1824 trabalham com a mesma função: perceber os movimentos da sociedade, padrões repetitivos, locais e globais, para prever para onde, como e quando iremos.

Características do Cool Hunter

Se o campo de conhecimento é vasto, não por acaso, as habilidades que um Cool Hunter precisa ter são relacionadas a entender e ouvir as pessoas, cruzar informações dos quatro cantos do planeta e ter uma boa bagagem cultural, mantendo a mente e as estantes sempre atualizadas.

Curiosidade, observação, grande capacidade de comunicação, poder intuitivo e atitude aberta e tolerante, amor pelo conhecimento, viver na cidade que observa, além de uma boa capacidade fotográfica, já que trabalhamos também com a análise de muitas imagens.

Mais que uma profissão ou um estilo de vida, atuar em Cool Hunting é uma maneira de ver o mundo. Começar a perguntar o porquê das coisas e não dar nada como óbvio.

Objetivos do Cool Hunter

Detectar as mudanças que nascem nas motivações, gostos e preferências do consumidor antes que se convertam em massivos, com a intenção de utilizar esta informação para inovar e antecipar-se à concorrência.

Detectar qualquer tendência que possa inspirar um novo produto, marca, posicionamento, mensagem de comunicação, estratégia de mídia ou forma de distribuição.

Detectar mudanças na esfera social que podem supor novas necessidades dos consumidores; necessidades que, provavelmente, nem foram explícitas de forma clara, e que seriam muito difíceis de serem identificadas com métodos de investigação tradicionais.

Detectar o ponto de equilíbrio exato, onde a inovação chegue nem muito antes e nem muito depois. Trazer uma inovação que o consumidor tenha capacidade de compreender, porque, se for muito antes, o consumidor não consegue contemplá-la, e se for muito depois, já estará massificada.

Alcance do Cool Hunter

Dentro do mercado de tendências, encontramos tanto empresas que trabalham de uma forma mais abrangente como empresas que trabalham para segmentos ou categorias especificas de mercado.

Hoje, com a demanda por inovação, é cada vez mais comum encontrar dentro de grandes organizações um departamento interno voltado à pesquisas e Cool Hunting.

Dessa forma, Cool Hunting é uma nova função dentro organizações, que se posiciona na intersecção entre estratégia, marketing, pesquisa de mercado e I+D (Investigação e Desenvolvimento).

Missão do Cool Hunter

O Trabalho do Cool Hunter consiste em detectar mudanças e inovações a seu redor que possam inspirar uma ação orientada na melhora da competitividade da organização. Ou seja, mapear uma novidade antes que ela esteja massificada, para que os resultados aumentem, seja em produto, em comunicação, em distribuição, ou em marca.

Essa ação pode ser um novo produto, a otimização dos existentes, um slogan, uma nova forma de distribuição, uma embalagem, etc…

A missão do Cool Hunting é encontrar aquilo que é original e forte o suficiente para despertar a atenção das pessoas no futuro.

Seja um Cool Hunter

A Escola São Paulo, junto com Sabina Deweik, preparou um curso online com o objetivo de te ajudar a dar início à jornada para mergulhar no incrível mundo dos exploradores da modernidade.

No curso online de Cool Hunting, o participante começa a entrar em contato com a disciplina e com o percurso para se tornar um Cool Hunter, um caçador de tendências. Também é revelada a estrutura de como funcionam os laboratórios de pesquisa de tendências e comportamentos: a fase de observação, de interpretação e a geração de insights.

No curso, você vai aprender como observar e captar novos comportamentos nos mais diversos setores como moda, design, arquitetura, cultura, arte, cinema, literatura, interpretar esses sinais da sociedade (as tendências emergentes) e, com isso, gerar insights de inovação para o desenvolvimento de produtos, serviços, ações de comunicação, distribuição, varejo ou simplesmente tirar uma nova ideia do papel.

#escolasaopaulo #descubra #reinvente #viva

Publicado em

DA EXCLUSIVIDADE À INCLUSÃO: UMA NOVA VISÃO DO LUXO

Por Sabina Deweik, do time Humans Can Fly e professora e colunista da Escola São Paulo. 

Quando você pensa em luxo, o que vem a sua cabeça? Exclusividade, status, ostentação, marca? Este conceito vem passando por grandes transformações, acompanhando também as grandes mudanças de comportamento da sociedade. 

Existe hoje uma nova relação entre preço e valor. Na década de 80, por exemplo, aquilo que tinha um preço elevado, tinha um valor alto. Preço e valor tinham uma relação quase que direta, linear. Hoje, nem tudo que tem um preço elevado tem grande valor para as pessoas. Muito pelo contrário. Há experiências de grande valor que são gratuitas ou extremamente acessíveis: fazer download de suas músicas preferidas, ter conexão wi-fi, tomar uma xícara de café com seu melhor amigo ou simplesmente poder se desconectar.
Grande parte das pessoas está deixando para trás o velho conceito do que é luxo no qual o sentido era ter algo que denotava status social. O exibicionismo vai dando espaço para o consumo de luxo ligado a experiências autênticas e empáticas.  

Essa nova visão, me remeteu a um documentário que assisti recententemente: “Minimalism: a documentary about the important things” (Minimalismo: um documentário sobre as coisas importantes), disponível na Netflix. No filme, os amigos de infância Joshua Fields Millburn e Ryan Nicodemus, os personagens principais, resolvem largar uma carreira estabelecida e um cargo no qual ganhavam um salário de dois dígitos para viver com mais satisfação e menos coisas. A partir daí, escrevem um livro sobre essa experiência e partem para uma viagem pelos EUA para promover o livro. 

Há quem critique a visão de que reduzir, ter menos poder financeiro, trará mais felicidade. Porém, analisando o documentário do ponto de vista dos movimentos sociais emergentes, me dou conta da importância deste tema na atualidade.
Ao longo do filme, especialistas de diversas áreas mostram alguns motivos pelas quais povos ocidentais perpetuam o fenômeno do consumismo desenfreado: a propensão a comprar compulsivamente por conta de sentimentos positivos que este hábito proporciona, a publicidade e o barateamento de produtos, como roupas e eletrônicos. Um dos autores e pensadores que admiro muito, Gilles Lipovetsky se debruça sobre essa questão pontuando no livro A Era do Vazio os efeitos da cultura na qual estamos inseridos: “A cultura pós-moderna é voltada para o aumento do individualismo, diversificando as opções de escolha, cada vez mais opções de escolha sobre tudo em uma sociedade de consumo; levando a perda de uma visão crítica sobre os objetos e valores que estão a nossa volta”. Sobre essa questão do valor venho me questionando imensamente: Qual o valor de X na minha vida? Para que?  consumo consciente coolhuntingQuestionar-se sobre o “para que” e não sobre o “porque” de algo abre uma perspectiva de qual o real valor daquela coisa, daquela experiência para cada indivíduo. Assim, a ideia perpetuada até hoje de que os bens devem ser consumidos mais rapidamente e em maior volume vai se desconstruindo. O Lowsumerism (união das palavras em inglês “low“- baixo com “consumerism” – consumismo), tendência crescente, vêm confirmar estas novas direções. O movimento, que vem ganhando adeptos em todo o mundo, tem como proposta repensar a lógica de consumo na busca por mais consciência e equilíbrio na hora de comprar.  

Ele se instala como uma alternativa a nossa herança consumista desde a Revolução Industrial e do modelo Fordista (nome em homenagem ao criador do método, o americano Henry Ford), que disseminava a produção em série.

Desde lá, a sociedade e o ideal de consumo foi crescendo com o chamado sonho americano e o atual esgotamento do planeta.  

Por coincidência ou não, este ano de 2018, mais especificamente o dia 1 de agosto, foi considerado pela ONG Global Footprint Network, o dia da sobrecarga da terra: em apenas 212 dias de 2018, os 7,4 bilhões de habitantes do Planeta Terra esgotaram os recursos naturais de comida, água, fibra, solo e madeira disponíveis para os 365 dias do ano. Traduzindo em miúdos: a humanidade está em dívida com a natureza. De acordo com a ONG, se não mudarmos nosso padrão de consumo, antes de 2050 precisaremos de dois planetas Terra para conseguir suprir todas as nossas necessidades. Quando pensamos nesta escala de valores, nos damos conta de que o Lowsumerism não é nem mesmo uma tendência. Eu chamaria de emergência. 

No rastro do Lowsumerism surgem outros movimentos como o upcycling; o reaproveitamento de materiais antigos ou que seriam descartados e a economia do compartilhamento; a sharing economy. A era da posse dá lugar a era do acesso: Uber, Airbnb, Coworking, bicicletas compartilhadas, Spotify, Netflix. Hoje é possível alugar uma incrível bolsa de uma marca de luxo e devolvê-la para que outro use, é possível se hospedar numa casa dos sonhos por um bom custo-benefício através de ferramentas como o Airbnb ou ainda trabalhar em um local incrível e conhecer pessoas, como é o caso dos co-workings, sem precisar pagar uma fortuna por um escritório.  Você usufrui, mas não possui. O desejo de consumo não cessa, apenas você não tem mais a posse do produto. Segundo as projeções da consultoria PwC, a economia compartilhada deverá movimentar mundialmente US$ 335 bilhões até 2025 — 20 vezes mais do que se apurou em 2014, quando o setor movimentou US$ 15 bilhões.Consumo consciente empreendedorismo cool huntingNeste sentido, as novas gerações têm sido extremamente importantes para este impulsionamento e para a ressignificação do luxo, imprimindo valores como sustentabilidade, propósito, autenticidade e transparência. 

No relatório “Millennials Drive The Sharing Economy”, conduzido pelo analista da Forrester Jonathan Winkle, a taxa de uso dos Millennials em negócios compartilhados é mais do que quatro vezes maior do que a dos Baby Boomers. Os dados revelam de fato que os Millennials impulsionam a economia compartilhada, em parte porque detêm valores diferentes dos consumidores mais antigos. 

As gerações mais jovens gastam mais em experiências do que em produtos materiais. 

Sinal dos novos tempos é o evento recém lançado em junho de 2018 em Arnhem, Holanda, o State of Fashion, uma iniciativa que apoia e ativa a busca mundial por uma indústria da moda mais justa, limpa e sustentável, conectando designers, empresas, governos, instituições educacionais e consumidores de moda e têxtil. Com o tema “Buscando o Novo Luxo”, as novas definições são exploradas como resposta às urgentes demandas ecológicas e sociais de hoje: menos desperdício e poluição, mais igualdade, bem-estar e inclusão – valores muito cultuados tanto pela geração dos Millennials como pela geração z.  

É dentro deste contexto que o luxo exclusivo vem dando lugar ao luxo acessível e inclusivo. Entramos na era dos Experiential Seekers – consumidores que passam a ter valores pós-materialistas e buscam por experiências intensas e com significado. E para você o que é o verdadeiro luxo?  

Publicado em

FOME DE QUÊ?

Por Marcelo Cunha Bueno

Somos o que lemos. Cada linha lida, cada página que se vira, cada livro degustado. Somos os filmes a que assistimos. Cada letreiro que sobe, cada cena que marca, cada fala que fica, cada atuação que inspira. Somos as músicas que ouvimos. Cada melodia cantada, cada instrumento que pulsa, cada acorde que nos faz recordar. Somos a memória do que sentimos quando a arte nos invade. Do corpo à alma, somos feitos da estética que nos atravessa ao longo da vida. E quem somos desenha o que fazemos. Nossas ações são diferentes tonalidades do que vivemos na vida. Minha ação profissional é composta pela música que não sai de mim. A ideia que projeta novos trabalhos é feita das imagens que conhecemos durante a vida. Alimentar a alma com arte é tão estruturante quanto alimentar a alma com academicismos (que, aliás, são feitos de arte também). Meu papel como educador é o de dar fome às pessoas que me escutam e fazer com que tenham coragem de entender que suas vidas precisam de escolhas que se conectem ao alimento da alma.  

Marcelo Cunha Bueno é educador há mais de 20 anos, inspirado pelo chão da Escola, especialista em desenvolvimento infantil.